Blogue Insónias

A transparência não pode ser Raríssima

Fico abismado ao ler pessoas com responsabilidades que dizem em público que “a mesa de uma AG não tem responsabilidade nenhuma”. Há aqui um problema gravíssimo de comunicação que pode colocar pessoas de valor em cheque. Espero que quem me esteja a ler reflita sobre o que estou a dizer.

Os membros da mesa de uma AG votam, como todos os associados. Portanto, aprovam (se votam a favor), ou não aprovam (se votam contra),  aquilo que estão a apreciar e votar. Podem ainda sair da sala e fazer constar da ata que não estiveram naquele ponto da agenda, podem fazer declarações de voto, etc. No entanto, os membros da mesa da AG de qualquer associação têm responsabilidades suplementares, dadas as responsabilidades de organização da AG, agenda, colocação de documentos à disposição dos associados, verificação da legalidade do que é colocado a discussão e votação, etc. Os membros da mesa têm obrigação de ler o que colocam a votação.

Neste caso da Raríssimas, no que se refere ao Ministro Vieira da Silva, ele reconhece isso mesmo ao dizer: “As contas da Raríssimas eram aprovadas na assembleia-geral e, desse ponto de vista, tinha conhecimento [das contas] mas nunca tive conhecimento, nunca foi identificado, nem apresentado por ninguém nessas assembleias-gerais qualquer dúvida sobre essas mesmas contas”. Ao ler as contas, tomou conhecimento delas e se tivesse a mais leve dúvida sobre o que lá estava, devia procurar todos os esclarecimentos junto, nomeadamente do conselho fiscal, ou, sendo o caso, do técnico oficial de contas, do revisor e, ainda, como parece ser o caso, do auditor! Não teve, aparentemente, porque não expressou que assim tivesse procedido. E, mais diz, que nenhuma dúvida foi levantada nessas assembleias gerais. Existem relatos que dizem o contrário, pelo que se justifica a auditoria anunciada pelo Ministro Vieira da Silva.

Na minha opinião, e acreditando com sinceridade na boa-fé do ministro, penso que a auditoria deveria ser feita pelo gabinete do PM, pois há aqui um evidente conflito de interesses.

O ministro, em minha opinião, deveria anunciar que vai implementar um portal de transparência para todas as instituições que têm apoios da SS e que pensa que neste caso a auditoria deveria ser feita pelo gabinete do PM. Ou seja:

1) Deveria criar um local na WEB, parecido com o BASE.GOV.PT, onde se deveria publicar, de forma simples e detalhada, toda a informação sobre as instituições apoiadas com dinheiro dos contribuintes. E essa informação implica: estatutos, organização, serviços prestados, forma de gestão, ordenados dos dirigentes, planos de atividades, orçamentos anuais detalhados, contas anuais, relatório/parecer do ROC, relatório de gestão, etc. Deveria ainda ser muito claro qual foi o apoio prestado pelo Estado, em valor, bem como em que serviços foi aplicado, sendo esses valores acompanhados pelo relatório dos serviços do ISS sobre a aplicação dos recursos recebidos.

2) Deveria convidar os cidadãos a verificar toda essa informação, a ler os relatórios e a perceber como é gasto o nosso dinheiro.

Não há nada confidencial, muito menos as contas, quando está envolvido o dinheiro dos contribuintes.

Nota: as contas de uma associação são preparadas pelos serviços de contabilidade sob supervisão de um TOC. Depois, tem de existir um relatório de um ROC (li que no Governo da PàF se dispensou o relatório do ROC, o que é uma coisa absurda – ver lei 172-A/2014 de 14 de Novembro, artigo 14º, nº3) e, finalmente, um parecer do Conselho Fiscal da associação. Só nessa altura as contas são apresentadas aos associados para discussão e votação. A sua aprovação não é automática. É por isso que há uma AG de discussão e aprovação de contas. Se não fosse assim, as contas seriam automaticamente aprovadas com os pareceres. Mais, os relatórios do ROC devem ter anotações que alertam para os perigos, com ênfases, etc. Os associados têm, claro, de ver os números, prestar atenção aos detalhes, se querem fazer uma votação consciente. Se não o querem fazer, estão no seu direito, mas tomam como boa a opinião de outros. O facto de alguém dar parecer (por exemplo, o conselho fiscal – cuja competência técnica pode não ser a melhor), não dilui a nossa responsabilidade como associados.

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