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Repensar os sistemas políticos

É urgente que nos dediquemos, sociedade civil incluída, a levar a cabo este exercício. Mudar pode ser algo complicado porque a maioria considera que “ ou não é ouvida” ou pura e simplesmente é impossível mudar.

Os recentes acontecimentos na Europa e no Mundo levam a que esta discussão seja cada vez mais urgente. O que se tem verificado é que quem ganha pelo voto popular não governa e se as pessoas já consideram que o seu voto de pouco ou nada vale, não tarda, desvinculam-se de vez desse dever cívico.

Eu defendo, à luz do que se passa no Brasil, por exemplo, que o voto seja obrigatório e traga consigo responsabilidades. As pessoas com o passar do tempo têm-se tornado avessas a obrigatoriedades pois consideram que isso condiciona as suas liberdades. E isso estaria correcto e consentâneo com o espírito da Democracia, não fossem elas libertinas nas suas escolhas. No caso português, por exemplo, é inadmissível que a abstenção seja o maior Partido português independentemente do acto eleitoral a que se refira e que os cidadãos se achem no direito de delegar naqueles que se importam e votam, a responsabilidade de uma escolha que também é sua. Mas depois queixam-se, e criticam…muito…em demasia até visto que na maioria dos casos nem sequer apresentam soluções ou alternativas para o problema que ajudaram a criar.

O que se passou em Portugal, em Espanha e agora nos EUA é revelador de outro sintoma do cidadão eleitor. Como está cansado do status quo vigente, ele arvora-se o direito de forçar o “equilíbrio de forças” esperando com o seu voto disperso obrigar a que os Partidos do chamado “ arco de governação” assumam as suas responsabilidades e trabalhem em conjunto. Em teoria, este raciocínio pode ser considerado brilhante mas na prática não passa de um fait divers impraticável. O que acontece é uma cada vez mais extremada separação entre o que vulgarmente, e erradamente, é considerado Esquerda e Direita fazendo desaparecer o Centro, o equilíbrio, portanto.

A falta de participação quer dos militantes, que se cansam das más decisões dos aparelhos partidários e que permitem que por falta de oposição interna os mais fracos vençam, aliada ao facto de repetidamente se afirmar que “são todos iguais” leva a este divórcio entre a sociedade civil e a política. Neste momento torna-se cada vez mais importante e urgente que se modifique esta situação.

Era necessário que se percebesse que há necessidade dos Partidos pequenos. Nacionalistas, extremistas ou o que seja, esses Partidos podem levar à discussão temas fracturantes que os Partidos maiores não podem, seja porque a preocupação de gestão de um país não permite tempo para esse tipo de debate ideológico, seja por questões de discurso eleitoralista. Por seu turno e por não terem – nem na maioria ambicionarem ter – essa posição, os Partidos pequenos podem e devem pegar nessas questões e dar-lhes voz mas isso não significa – até muitas vezes pela radicalização da sua base ideológica- que estejam em condições de governar seja sozinhos seja coligados. Podem no entanto servir de força de bloqueio porque consideram que podem levar a ideologia à prática ipsis verbis. A falta de experiência governativa, e muitas vezes até profissional, leva a que cometam esses erros pueris. Mas a conversa dura de contestação do sistema cola no eleitorado que insiste em buscar um Messias e são vários os nomes ao longo da História.

Os italianos viram-no em Mussolini, os alemães em Hitler, os espanhóis em Franco, os americanos em Obama e mais recentemente em Trump.

Há discursos anti-sistema e há, no meio dos soundbytes argumentos que até são verdadeiros e válidos. A questão é que eles não podem ser retirados do seu contexto e da conjuntura política e económica mundial sob pena de serem ridículos e ridicularizarem quem os profere.

Senão veja-se: Trump pratica o discurso do ódio, tem menos votos mas ganha o Grande Colégio eleitoral e como tal ganha as eleições. Passos Coelho tem o discurso do rigor e da continuidade. Ganha as eleições coligado, mas quem assume governo é o segundo partido mais votado numa coligação pós-eleitoral com todo o espectro de Esquerda que estava completamente contra o rumo sufragado pela maioria dos eleitores. Em Espanha, a recusa de o PSOE formar uma aliança com o PP ganhador levou a que o acto eleitoral fosse repetido 3 vezes até conseguirem finalmente formar governo. E tudo porquê? Porque o eleitorado está cansado de pagar os erros que não comete e de não ver ninguém a ser penalizado por isso, antes pelo contrário.

E este estado de coisas e o facto de proliferarem os Partidos nacionalistas com maior ou menor visibilidade, levou a Itália a tomar uma medida extremamente importante: demorou 15 meses mas conseguiu reformular a Lei Eleitoral. Esta Reforma deveria acontecer na maioria dos países pois ela está desactualizada a muitos níveis quer a nível de densidade populacional, quer de representação dos territórios e nisso os EUA estão bastante desenvolvidos.

Para evitar precisamente o bloqueio dos Partidos pequenos que em nada contribuem para as soluções – a não ser como dito anteriormente por trazerem temas fracturantes a debate – Itália reformulou a sua Lei eleitoral e assim, a partir de agora, governará quem de facto ganhou as eleições sem entendimentos torpes da Lei Constitucional. Assim, os eleitores são responsabilizados pelas suas escolhas e sabem que o Partido (ou Partidos) mais votados nas eleições são aqueles a quem é concedida a prerrogativa de governar sem soluções circenses ou enormes coligações que normalmente agregam interesses díspares e conflituantes.

Eu gostaria que as Democracias do Mundo colocassem os olhos na Itália e seguissem o exemplo pois isso evitaria muitas surpresas desagradáveis no futuro visto que os Partidos não ouvem o eleitorado e os media se consideram os únicos opinion makers com credibilidade quando se deviam cingir ao seu papel de informar e não de opinar ou julgar.

Não é difícil perceber o fenómeno da emigração, dos refugiados, da distribuição desigual da riqueza, do desemprego e de todas as questões sociais e o seu peso nos actos eleitorais. No meu entender, a credibilização dos políticos passariam pela profissionalização da classe e respectiva responsabilização “ ao minuto” no desempenho dos cargos independentemente da área desde que fossem considerados “cargos públicos”. Mais uma vez neste ponto temos muito a aprender com os americanos em que os interesses do cidadão eleitor estão acima de todos os outros, inclusive dos nacionais.

Isso aliado a uma mais adequada Lei Eleitoral, um número consideravelmente menor de deputados nas Assembleias (todas elas sem excepção), a uma maior participação do cidadão na vida interna dos Partidos e da sociedade civil em geral no sentido de debater de forma aberta e alargada as questões de importância nacional sem extrapolar o seu conhecimento seriam uma mais-valia para a credibilização dos sistemas políticos e para o seu melhor funcionamento.

Cidadão mal-informado pensa no seu pequeno quintal. Cidadão informado pensa no Todo. Em qual dos lados da barricada acha que estaria melhor?

 

Luisa Vaz

(A autora não usa o Acordo Ortográfico)

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