O Programa Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroeléctrico (PNBEPH),tem por objectivo aproveitar o potencial hidroeléctrico nacional ainda por explorar, através do estabelecimento de rigorosos critérios de seleção dos locais para implantação de novos grandes aproveitamentos hidroeléctricos que concorrem para o cumprimento das metas energéticas estabelecidas. Pressuposto em três “pilares essenciais“, como as linhas orientadoras do Plano Nacional da Água, a intenção de descarbonização profunda da economia e o respeito pelos compromissos assumidos com os promotores e destes com as autarquias, o PNBEPH foi-nos, em nome de uma causa nobre – que nos cumpre efectivar – enfiado como fundamental pelos olhos (e bolso!) adentro.
Lindo!
O tempo, essa coisa deveras fungível, desde a imaculada apresentação da necessidade destes investimentos, em Dezembro de 2007, tem vindo a demonstrar uma série – que é, infelizmente, repetitiva no espectro político-partidário governativo – de episódios mal contados.
A crise mundial das dívidas soberanas prestes a rebentar-nos no colo, mas, nada como investir. Investir, investir, investir. Mesmo não havendo dinheiro. Mesmo que o investimento seja completamente incompreensível. Alguém pagará a factura (e a da electricidade, está sempre a subir!).
Dei-me ao trabalho de googlar um par de exemplos, tidos como estruturantes, numa política energética necessária, fundamental para um desenvolvimento sustentável e mais amigo do ambiente. O exercício de googlar, consistiu em escrever no browser o PNBEPH, depois o nome da(s) empresa(s) de energia, respectiva(s) administração, …O resto das interconexões, porque, isto anda tudo ligado, fica ao critério da leitura pessoal que cada um queira. Obviamente.
Ponto de partida:o PNBEPH, programa negociado pelo executivo liderado por José Sócrates com a EDP, Endesa e Iberdrola. Selecção aleatória dos casos mais graves, naquelas propostas 10 barragens fundamentalíssimas iniciais.
1) A EDP, e e o desastre ambiental e atentado ao património mundial da UNESCO que o projecto da barragem do Foz-Tua representa, consegue construir a barragem e apresentar a produção de energia pronta a arrancar. Mesmo que em junho 2011, o Governo (de Passos Coelho e Paulo Portas) tenha recebido relatório da UNESCO que pedia a “interrupção imediata” da construção da barragem invocando um “impacto irreversível” no Alto Douro Vinhateiro. A EDP, liderada, por António Mexia, permitiu que a obra fosse realizada em velocidade warp, conduzida pelo consórcio da Mota-Engil. Salientaria o facto de o enchimento da albufeira da barragem do Tua de forma ilegal foi a gota de água que fez transbordar o copo das associações ambientalistas representadas na Comissão de Acompanhamento Ambiental (CAA) da barragem do Tua, em Setembro de 2016, ter passado despercebido ao cidadão comum.
2) A ENDESA, apresentava um projecto de cerca de 500 milhões de euros de investimento, para duas barragens no Mondego. Liderada por Nuno Ribeiro da Silva(antigo secretário de Estado da Energia, do Governo de Cavaco Silva), por exemplo, a decisão do Governo de Passos Coelho e de Paulo Portas de suspender a renda das garantias de potência, conduziu a ENDESA a um repensar o (des)investimento previsto. Fora da corrida pelas barragens, o adiantamento de 90 milhões de euros ao executivo de Sócrates, apresenta-se agora como sem custos para o contribuinte (quantas vezes nos martelam com este chavão?):”O pagamento inicial que foi feito pela empresa no momento da celebração do contrato em 2008, não terá que ser devolvido, por isso não há custo nenhum para os contribuintes em nenhum momento”.
3) Finalmente, reza a internet, que nunca esquece, que com a entrega de um “cheque” de 303 milhões de euros ao Governo de Sócrates, em 2008, a Iberdrola, justificava – desde logo por tal montante assim entregue ao governo – a “necessidade” da construção de uma barragem(ou complexo de barragens), no Tâmega. Esta necessidade aparece definida, como um pilar estruturante, da nossa política energética, cujo seu Presidente, Pina Moura, foi gerindo até à sua saída em meados de 2014.
Fim.
Daquelas dez barragens iniciais, apenas (aplausos!), resistiriam à frugalidade do tempo-político, Foz Tua, Fridão e Sistema Electroprodutor do Tâmega (Daivões, Gouvães e Alto Tâmega). Para aprofundarmos um pouco mais o tema, e porque a opinião pública tende a considerar a que a construção das barragens é feita através de investimento privado, e na prossecução de “energia verde”, nada como lermos o Memorando «O Programa Nacional de Barragens: desastre económico, social e ambiental».
Como a generalidade do cidadão comum tende a fazer “ouvidos de mercador”, polarizando-se e barricando-se, em função desse amor eterno à camisolite, o que é certo é que, neste caso, este ambicioso PNBEPH aparece comprometido pelo chorrilho de mau investimento(a todos os níveis) cuja beneplácita mão do poder político que nos governa, abençoa.
Deixo as interconexões, possíveis, reais, imaginárias, de lado. Todavia, recupero um relatório, que pela pertinência do seu título, rematará as pontas soltas das vossas dúvidas(que serão também as minhas):«Vêm aí mais barragens, mas o consumo de electricidade vai continuar em baixa». Deixo-vos as insónias das conclusões. Mas, Eduardo Guerra Carneiro tinha razão, isto anda tudo ligado. Mesmo que nunca consigamos compreender o «isto».