Da utopia à razão de ser
Em poucas situações duas simples palavras podem significar tamanhas diferenças na forma de ver o doente
O doente/cliente é resultado de uma opção livre, surge porque tem mais confiança, porque exerce um direito de escolha, confia enquanto a sua informação , a sua consciência ou a sua percepção lho indicar. O cliente em saúde, informa-se e decide. Faz da variedade de oferta, do conhecimento e rigor da informação, uma oportunidade. É a resultante de uma sociedade livre onde a sua opinião conta. Também, não sendo necessariamente um instrumento de lucro mas sim a primeira e última razão da viabilidade e sobrevivência das organizações . O doente entra por uma porta que lhe é aberta pela qualidade e pela liberdade, mas ele próprio pode fechar quando essa qualidade deixa de existir.
Por outro lado, o doente/utente utiliza o que lhe mandam, a sua opção não existe – é ditada por fatores geográficos, políticos, por redes de cuidados, por entidades que em gabinetes decidem por ele. É uma realidade passiva, sem alternativa e dificilmente lhe é permitido mudar. Representa um número que é esgrimido pela estatística, pelos rácios,pelos relatórios, pela casuística. São tão importantes os dados que, por vezes, interessa mais o computador do que a pessoa doente.Até as reclamações, são expressas em modelos formatados e as respostas padronizadas. Alimentam o coletivismo de uma organização em que, ao invés das pessoas, os processos estão em primeiro lugar. O utente entra nas Unidades prestadoras por comportas, em turbilhão – vai na corrente que alimenta listas de espera . Muitas são artificiais e nem deviam existir,mas são a resultante de uma gestão que não contempla nem a eficiência nem o mérito.
Pode,o ser-se doente/ cliente, encerrar um estigma de negócio e até ser alvo de práticas abusivas. O papel regulador,auditor e garante do Estado e das Ordens Profissionais é fundamental. A saúde sendo uma atividade económica não se furta a estar inserida num mercado global e específico.É um falso pudor não encarar o doente como cliente. A realidade de o tornar desejado é muito melhor do que o aceitar pela simples circunstancia de não ter opções de escolha.
A liberdade de escolha em saúde é um ato de moderna cidadania que exige que se fomente e favoreça a literária em saúde. A escolha não pode ser só informada pelo marketing dos Operadores ou pela “passa palavra” dos doentes. Os prestadores devem ser obrigados a publicar informação certificada ( ex : casuística por patologia, resultados clínicos,mobilidade e mortalidade, certificações, etc). A possibilidade de uma escolha informada traduz transparência do Sistema de Saúde.
Numa sociedade evoluída passamos da utopia da liberdade de escolha, para uma nova realidade em que o Estado deixa de tutelar a vontade do doente – sem que isto significa perda de acessibilidade e garantia de direitos. O doente cliente ,não distingue uma Unidade de Saúde por ser de gestão pública ou privada mas porque o serve melhor.
Infelizmente, a liberdade de escolha autentica, que contemplaria todos os cidadãos e prestadores do País é impraticável no nosso País porque, ao invés da restante Europa, o nosso SNS está refém da ideologia e repele qualquer sinal de mercado e concorrência. Ainda pior nas atuais incongruências políticas.